LONGEVIDADE: DIETA, ATIVIDADE FÍSICA E MUSCULAÇÃO

Marco Andrade, MD
11 min readSep 13, 2023

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Muitos de nós já ouvimos falar das zonas azuis que existem em cinco áreas no mundo, como a de Okinawa, no Japão, e a de Ikaria, na Grécia. Nessas zonas azuis, encontramos uma grande quantidade de idosos centenários gozando de uma excelente saúde física e mental.

O que se observa nessas populações das zonas azuis?

Muita atividade física e consumo de dietas principalmente à base de plantas. A carne é consumida, em média, uma vez por semana, em porções pequenas.

Alimente-se como um mediterrâneo

A dieta da longevidade deve seguir um padrão alimentar geral e a dieta mediterrânea é considerada o padrão ouro para uma vida mais longa e com mais saúde.

A dieta mediterrânea caracteriza-se por alta ingestão de frutas e legumes; grãos integrais; ervas; gorduras saudáveis ​​de oleaginosas (castanhas como nozes, macadâmia, pistache, castanha do Pará, amêndoas e outras), azeite e abacate, além de frutos do mar, algumas vezes por semana. A carne pode ser substituída nas refeições por leguminosas (feijão, lentilha, ervilha e grão-de-bico). Deve haver um consumo moderado de laticínios, ovos e vinho e uma ingestão limitada de carne e doces.

Por outro lado, muitos estudos relacionam o uso do chá verde a um menor risco de doenças cardíacas, câncer, diabetes tipo 2, Alzheimer e obesidade. Um estudo de acompanhamento por seis anos, envolvendo adultos japoneses mais velhos, demonstrou que aqueles que beberam uma quantidade maior de chá verde — sete ou mais xícaras por dia — tiveram 76% menos chances de morrer durante o período de acompanhamento do estudo. Um outro estudo que envolveu mais de 40.000 adultos japoneses, acompanhados por até 11 anos, indicou que as mulheres que bebiam, no mínimo, cinco xícaras de chá verde por dia, tinham um risco 23% menor de morte por qualquer causa.

Mas, devemos ressaltar que o objetivo da “dieta da longevidade” é proporcionar uma vida melhor, com mais bem-estar mental e físico, com redução da ocorrência de demência senil. Apesar da genética desempenhar um papel importante, o estilo de vida é um fator significativo para a longevidade, e aqui a nutrição é parte fundamental para os resultados positivos.

Comer mais frutas e vegetais é um dos hábitos mais importantes que se deve adotar.

Uma meta-análise publicada no British Medical Journal descobriu que um maior consumo desses alimentos está associado a um menor risco de mortalidade por todas as causas, especialmente doenças cardíacas. Os investigadores sugerem, pelo menos, o consumo de cinco porções por dia.

Há vantagens em se ingerir mais oleaginosas?

Não há dúvidas quanto a isso. Muitos afirmam que as oleaginosas estão ligadas à extensão da vida. E o que as oleaginosas oferecem? Elas fornecem gordura saudável, proteínas vegetais, fibras, antioxidantes, vitaminas e minerais essenciais, como potássio e magnésio.

Um estudo que reuniu mais de 7.000 homens e mulheres por quase cinco anos, comparando três tipos diferentes de dietas, demonstrou adicionalmente que, comparados aos que não comem nozes, amêndoas, castanhas e outros, aqueles que consumiram mais de três porções de 30 gramas de oleaginosas por semana tiveram um risco menor de mortalidade geral de 39%.

E quanto a atividade física?

Bem, o estudo dinamarquês “Danish Twin Study” informa que apenas 20% da nossa longevidade é determinada por genes. Os outros 80% estão a cargo do estilo de vida e do ambiente. Isso significa que, mesmo que envelhecer seja inevitável, o modo como envelhecemos tem tudo a ver com as nossas escolhas.

Marcos Santos/USP Imagens

As lições das “zonas azuis” são extremamente valiosas: são conselhos de uma boa vida e uma boa velhice por quem já passou e passa por isso com sucesso.

E onde tudo começou? Tudo começou na Sardenha. Foi a primeira “zona azul”.

E porque a denominação “zona azul”? Os especialistas, em demografia, ao delimitar a área de estudo de longevidade da ilha, marcaram o mapa de azul, dando origem à primeira “zona azul”.

Hoje, estão descritas cinco “zonas azuis” ao redor do mundo: Okinawa, no Japão, Loma Linda, nos Estados Unidos, Icária, na Grécia, Península de Nicoya, na Costa Rica, e a Sardenha, na Itália. Sabemos que esses lugares são distantes entre si e com culturas muito diferentes, mas o pesquisador e escritor norte-americano Dan Buettner conseguiu identificar neles alguns pontos comuns que fazem com que essas regiões azuis tenham uma expectativa de vida alta.

E quais são esses pontos comuns?

Buettner resumiu em algumas lições. E o que é surpreendente é que podemos aplicar todas essas lições na nossa própria cidade.

A primeira lição é “mexa-se naturalmente”. O que fazem as pessoas nas “zonas azuis”?

Essas pessoas não correm maratonas nem frequentam academias, mas caminham em “montanhas íngremes” para chegar ao trabalho e moram em casas verticais com 2 ou 3 andares (usando as escadas, várias vezes durante o dia, aliás esse exemplo vem da Sardenha). Cuidam das suas próprias hortas e uma caminhada na natureza é a diversão habitual. Vale ressaltar que os exercícios regulares de baixa intensidade são benéficos para o tônus muscular, mobilidade e alívio do estresse.

A restrição calórica é importante. Parar de comer quando se está 80% satisfeito traz habitualmente benefícios para o organismo. O cérebro demora a “entender” a saciedade, em média, isso ocorre em 20 minutos, e a decisão de parar antes do 100% de satisfação ajuda a evitar o exagero. Então, coloque sempre pequenas porções no seu prato, coma devagar e tente perceber as reações do seu organismo. Não é incomum que a gente, a cada refeição, ultrapasse o momento de satisfação plena.

Como indicamos anteriormente, faça como todos os habitantes das “zonas azuis”, a carne e produtos de origem animal devem ter um papel secundário. Não é necessário adotar uma dieta vegetariana, mas a “dieta dos centenários” se baseia em produtos frescos e vegetais. Verduras, frutas, legumes e castanhas, sempre frescas e preparadas em casa, são o alicerce da longevidade. Embora haja controvérsias mais recentes em publicações científicas quanto as vantagens do uso de bebidas alcoólicas (particularmente, o vinho tinto); nessas “populações centenárias”, em particular, naquela da Sardenha, é comum o consumo de uma taça de vinho tinto por dia. Os pesquisadores que sugerem o consumo de uma taça de vinho tinto por dia indicam que a presença do polifenol resveratrol pode ter efeito positivo para problemas circulatórios e para a saúde do coração.

Uma das lições é: Busque o seu “ikigai”, conforme fazem os okinawanos. Buscar a razão por que se levanta da cama. Os habitantes das “zonas azuis” têm isso muito claro: trabalho, família e amigos (uma boa prosa com os amigos, à tarde).

Não tenha uma vida acelerada, busque níveis mais baixos de estresse. Faça caminhadas com amigos.

Desacelere e faça coisas que nutram a alma: para alguns, pode ser um afazer religioso ou, mesmo, uma caminhada com os amigos. Níveis mais baixos de estresse significam menos inflamações crônicas.

Prioridade à família — a maioria dos centenários das “zonas azuis” vivem com gerações mais novas da família, uma interação benéfica para todos, para os mais velhos e para os mais novos (uma troca importante de informações e de experiências). Isso representa um “ganho de mão dupla” para essas gerações. Os pesquisadores já demonstraram que, quando se prioriza a família, geralmente há um retorno em forma de cuidado e carinho.

Esteja próximo das pessoas certas. Isso ajuda a obtenção de conexões sociais profundas que estão ligadas diretamente à longevidade. E se os seus contatos seguem hábitos saudáveis, aumentam suas chances de seguir com esses hábitos

Vale a pena frisar que a primeira “zona azul” que está numa região montanhosa da ilha da Sardenha, entre 14 vilarejos da província de Nuoro, possui a maior concentração de homens centenários no mundo. Ali predominam famílias de pastores e pequenos agricultores, entretanto, como já foi salientado, a carne não é a principal fonte de alimento dos habitantes. As comidas típicas são o pão feito com sêmola de trigo duro, leite de cabra, um vinho típico da região e vegetais sazonais.

Há ainda um dado muito interessante na Sardenha. Muitas culturas ocidentais consideram o fato de envelhecer como um fardo, na Sardenha, os anciãos acumulam estima e são considerados tesouros culturais. Os habitantes dessa “zona azul”, quando envelhecem, são cuidados pela família. Mas, um outro aspecto importante nessa população, os idosos não se aposentam, apenas trocam de emprego, subindo e descendo morros com suas cabras e ovelhas, cortando lenha e abatendo animais.

Há muito a aprender também com os habitantes das outras “zonas azuis”, mas isso fica para uma próxima vez.

Como já vimos dieta e atividade física ganham importância para a qualidade de vida do idoso e para a longevidade.

E o que pode fazer o idoso quanto a atividade física, somente caminhar? O que mais pode fazer? Levantamento de peso?

Dr. Brandon Grubbs, Ph.D. (Middle Tennessee State University) comentou que o envelhecimento é uma das maiores ameaças à liberdade e à independência individuais devido à progressiva deterioração dos músculos. Com a avançar da idade, há diminuição da produção dos hormônios responsáveis por manter a massa muscular. Esse pesquisador acrescentou que essa situação se agrava ainda mais porque os idosos tendem a ser menos ativos e a comer menos proteínas (o consumo de proteínas tem importância para a manutenção de músculos fortes). Por outro lado, nos idosos, as células responsáveis pelo reparo muscular mostram resposta diminuída.

Como resolver essa situação?

Dr. Brandon indica uma solução: o levantamento de peso. A musculação ajuda a interromper a perda da função muscular associada ao envelhecimento. Esse pesquisador comentou que a musculação “estimula o crescimento muscular e melhora a qualidade do tecido muscular, o que significa que é possível gerar mais força com dada quantidade de músculo.”

Sua prática é vista por muitos apenas como uma forma de aumentar a massa muscular, no entanto, esse treinamento possui inúmeros benefícios. A musculação melhora o condicionamento cardiorrespiratório, diminui a quantidade de gordura, auxilia o emagrecimento, diminui o risco de diabetes, aumenta a autonomia em idosos e garante mais disposição física.

A sarcopenia (ou perda muscular pelo envelhecimento) começa por volta dos 35 anos e aumenta após os 60 anos de idade. A perda da nossa massa muscular é progressiva. A sarcopenia, conforme estudos anteriores, foi associada ao diabetes tipo 2, à hipertensão arterial e à obesidade. A sarcopenia pode aumentar o risco de doença cardíaca e de acidente vascular cerebral e “roubar” anos de vida. A liberdade de viver com autonomia pode ser comprometida pela sarcopenia, prejudicando não só a capacidade de levar a vida cotidiana como tantas coisas que foram programadas para a terceira idade, como, por exemplo, viagens de lazer.

Há algumas coisas simples que podemos fazer em casa para atenuar esse processo de deterioração muscular. Um exemplo: 1 a 3 séries de agachamento, 8 a 15 repetições, com o levantar e abaixar com controle e 3 a 6 repetições, com o levantar rápido e o abaixar lento. É recomendável um descanso de 2 a 3 minutos entre as séries.

O que ajuda a manter a forma física? Dr. Brandon recomenda: subir escadas (evitar o elevador, quando possível), sair de dentro do carro (caminhar mais), levantar da cadeira, carregar mantimentos.

Há um teste muito útil para a avaliação dos idosos que é o levantar da cadeira com os braços cruzados e sentar por cinco vezes consecutivas. Esse teste de avaliação denominado “Five Times Sit-to-Stand Test (FTSST)” foi considerado confiável, seguro e válido para medir a força muscular dos membros inferiores de adultos saudáveis ​​e para determinar o controle do equilíbrio, o risco de queda e a capacidade de exercício de indivíduos mais idosos. Mas, também, vale como uma atividade física.

Vale a pena ressaltar que a existência de doenças comumente relacionadas com as populações mais velhas — artrite, doença cardiovascular, diabetes, demência, osteoporose e acidente vascular cerebral — “não é por si só uma contraindicação ao exercício”, mesmo que uma só pessoa tenha todas essas doenças.

As diretrizes indicam que “para muitas dessas doenças, o exercício oferece benefícios não alcançáveis apenas por meio de medicamentos”. Obviamente, os idosos compartilham do medo comum de dor ou lesão, mas os especialistas indicam que “o sedentarismo parece uma doença muito mais perigosa do que a atividade física entre os mais velhos”.

Um pequeno estudo incluindo pessoas muito idosas (86 a 96 anos) apresentou resultados notáveis; após oito semanas de musculação, os participantes melhoraram a sua força muscular em 174% e houve um aumento de 9% na massa muscular das coxas. Os participantes do estudo residiam em uma instituição de longa permanência e não apresentavam doença aguda, entretanto não eram extremamente saudáveis.

Dr. Brandon ressalta que esse estudo demonstrou que até “o mais velho dos velhos” apresentou melhora na força e massa muscular e acrescentou “eu não conheço nenhuma idade em que não se possa melhorar esses resultados”.

Claramente, os idosos não ganham músculo e força tanto quanto os mais jovens — a resposta ao treinamento pode ser mais lenta — mas podem alcançar melhoras significativas da força e da massa muscular.

Obviamente, o idoso pode e deve pedir orientação ao seu médico para que possa adotar um programa de atividade física e musculação mais adequado para as suas condições de saúde.

Existem recomendações para que as pessoas com 65 anos de idade ou mais treinem duas a quatro vezes por semana em sessões com 30 a 60 minutos de duração. Mas, as palavras mais cautelosas do Dr. Brandon nos chamam a atenção. Basta um treino por semana para começar; e esse pesquisador ressaltou que um estudo anterior com pessoas com mais de 75 anos sugeriu que apenas uma hora de treinamento de força por semana pode melhorar a velocidade de caminhada, a força das pernas e a capacidade de se levantar de uma cadeira.

Há ainda mais uma importante recomendação do Dr. Brandon: Faça exercícios multiarticulares — movimentos tradicionais de força como o agachamento, desenvolvimento, supino sentado vertical, remo sentado e fortalecimento da região dorsal. Esses exercícios nos preparam melhor para as atividades da vida diária do que os exercícios de isolamento (os que trabalham um músculo específico) ou os exercícios em equipamentos — embora os equipamentos possam ser melhores para pessoas com problemas para pessoas com problemas de equilíbrio ou outras dificuldades que tornam os exercícios multiarticulares e de peso livre difíceis de fazer.

Mas, qualquer tipo de exercício pode ser modificado para atender o nível de aptidão de um idoso, em particular. Se um agachamento profundo não for possível, o meio agachamento (ou seja, realizar um quarto do movimento) pode ser satisfatório.

Por outro lado, um exercício que todos os idosos devem praticar é o “sentar para levantar”, de acordo com as instruções da coordenadora do programa de educação em saúde e bem-estar, Laura Grissom (EUA). As instruções da Sra. Grissom são: “Sente-se à beira de uma cadeira, com os pés no chão, e cruze os braços sobre o peito. Incline-se para trás até que suas costas toquem a parte de trás da cadeira, prepare seu abdome, e então vá para a frente e levante-se”. Comece com três séries de 10, e depois busque trabalhar em fazer mais rápido, como treinamento de potência.

A Sra. Grissom acrescentou ainda “Se você tem um problema de saúde, a melhor coisa que você pode fazer é se exercitar”.

E não importa quantos anos você tenha.

Referências

  • Forbes Life Fashion — Second Edition — 2022, June.
  • Medscape — 2023. August 15.
  • Preventive Medicine — Volume 87, June 2016.
  • Dtsch Arztbl Int 2011 May; 108 (20): 359–364

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Marco Andrade, MD
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Written by Marco Andrade, MD

Medical Doctor | Master’s degree, Nephrology | Clinical Researcher focused on Onco-Hematology, Infectious Diseases | 30+ years of experience

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